quarta-feira, 29 de outubro de 2008

As abóboras-fogo e os tomates vermelhos de tanto desejar...


Hoje me peguei feliz, desbravando a cidade de ônibus. Foi assim:

Decidi ir à Feira de São Joaquim já às 4 da tarde.

A feira.

Primeiro uma boca imensa de lábios finos e transbordante de gente, de coisas e cheiros.

Toda hora escapava alguém gritando: "Oooooooolha o freeeeeete!" E um cara: "Aussustô minina?" Assustei. Muito. Quando a vida tá muito urgente ir a uma feira, onde tudo se vende, se troca e se enrola é um perigo. Fiquei com medo de tropeçar e ser enrolada no jornal de ontem, que me vendessem como mercadoria, que me perdessem naquele mundo.

A feira: Medusa toda às cobras na cabeça. Medusa invertida, pervertida, onde o que é pedra vira vento, e céu vão, e esgoto e galinha fedendo pra ebó, e coisa barata e forte e viva.

Muito velho na feira, uma aridez masculina, de pêlos brancos na cara, nos braços, no corpo.
Muito velha a feira. Estranha. Ali até o que é feminino é sem gozo, sem possibilidade do erotismo: tudo bravio.

Tinha uma barraca, em frente àquela onde comprei banana da terra, em que passava um dvd - genérico - de um grupo de pornoforró (isso existe?) as mulheres eram enormes de gordas, rebolavam feito feras, cantavam mal, e uma platéia sedenta lhes lambia os gestos que vazavam no áudio e nos pontinhos coloridos da tv: simulacro.

A feira. A fera. Me devorou.

Quando me livrei de seus dentes cariados, havia em mim um fio de plenitude pois devorei, dentro do seu estômago, o pôr-de-sol com barcos e mendigos felizes por cima.

Quando saí, senti uma abstinência de seu fedor e retornei com uma desculpa de fazer um orçamento de umas coisas...quase que não saio, já disse...

Pois é.

Saindo de lá o mundo se abriu pra mim feito uma puta enternecida.
Ao primeiro ônibus que passou estendi a mão (para testar se ali era um ponto mesmo). Ele parou. Catei moedas, paguei e fui olhando o mundo, ouvindo conversas, rodei a cidade, andeeeei, quando estava já tonta de paisagem desci.

E a feira se converteu num mundo de carros desbandeirados, de gente triste e séria e vã...
Aí, algo falou baixinho:

"Que saudadezinha da casa sem tv ou internet. Do silêncio. Das coisinhas de Itabibocas..."