O mito que me cerca e me formou diz que, quando nasci, trouxe a luz. Na rua pobre de casas afaveladas de Itapuã, a noite dos nove meses em que estive no ventre de minha mãe eram sempre de puro breu, de uma escuridão tão verdadeira que não havia vela fraca ou candeeiro que silenciasse a sua negrura. Nestes nove meses estive recolhida, numa camarinha úmida, mais escura ainda, e vivia, no corpo negro de minha mãe, a vida que seu corpo pequeno atravessava.
Certo dia, preocupada em criar mais um filho na escuridão das dunas brancas, onde moravam boitatazes e lobisomens, minha mãe foi à Coelba e falou com o superintendente. Diante daquela mulher tão barriguda, tão pequena e de palavras vivas que pululavam sobre a sua mesa, ele não resistiu e presenteou o seu ventre largo com a luz nos postes da rua.
Quando meus olhos se abriram para as paredes pobres da casa, já havia a luz que minha mãe acendera.
Inda hoje ela vem, antes e depois de mim, acompanhando meus passos e acendendo as luzes: com isto, ela espanta os monstros que moram nos cantos, ilumina os medos que me atravancam o caminho, me aconselha firme e me guia, como a um barco de madeira nova, tangendo os mares.
a escuridão das dunas brancas. ótima metáfora!
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